quarta-feira, 13 de julho de 2011

Entrevista de Serguei para O POVO

@SergueiNews

"Sou escravo do sexo"

Roqueiro, louco e psicodélico, o cantor Serguei chega em 2011 aos 78 anos com energia de sobra. Ele diz que a história de ser pansexual foi inventada.



Na porta do hotel, à beira da Praia de Iracema, numa manhã nublada de sábado, Serguei recebe um grupo de crianças que se aproxima por conta do seu visual exótico. Calmamente, ele senta na escada e começa a dar autógrafos num encarte de supermercado que os novos fãs traziam à mão. “Ei, como é teu nome?”, pergunta um deles. “É Serguei, eu sou músico”, responde. “Tu é gay?”, se espanta um dos pequeno. O cantor olha de lado e ri.

Mesmo que esteja acostumado a tratar sua sexualidade sem pudor ou preconceito, Serguei não gostaria de chocar seus novos admiradores. Aliás, nenhum assunto pra ele parece ser segredo. Em Fortaleza, ele recebeu a equipe de O POVO para uma entrevista divertida onde falou sobre sua infância, drogas e sua relação com os grandes deuses do rock. Só não gostou ao ser perguntado sobre o uso ou não de Viagra. “Se você tiver saúde, não precisa de remédio, dos azuis. Eu nunca usei essas coisas”, devolve.

Nascido Sérgio Augusto Bustamante, este carioca de 77 anos – 78 no próximo 8 de novembro – continua sendo um fiel defensor e admirador do rock, principalmente dos Beatles (“a maior obra literária da história”) e dos Rolling Stones (“a maior banda de rock do mundo”). Não por acaso, ele transformou sua casa num Templo do Rock, onde mora com seus dez cachorros. Frequentemente tratado por títulos como “lenda”, “dicionário” ou “enciclopédia do rock”, ele prefere entrar para a história como “O divino do rock”. Acompanhe.

O POVO – Vamos começar do comecinho. Você é filho único dentro de uma família bem conservadora. Queria saber o que você lembra da sua infância e da sua casa?

Serguei – Era uma família bem... Era uma família com história, a família Nabuco. Minha avó era Heloise Nabuco, sobrinha de Joaquim Nabuco (político e jornalista recifense). E era aquela coisa: “você tem que ser oficial de marinha”. E me enfiaram num curso que eu fiz, mas fui reprovado em matemática. Eu fiquei com medo de falar com a minha avó, mas minha mãe falou, “ó, sua avó tá lhe esperando” e ela disse “Nabuco já é capitão de mar e guerra, foi promovido agora. E você? Você é uma vergonha”. Não pode falar assim. Cada um tem o direito de ser o que quiser, engenheiro ou travesti. Os antigos eram muito conservadores. Na nova geração, me lembro de Helô, minha prima, que jogava futebol na praia de Icaraí com a rapaziada e depois arranjou um filho com um vagabundo que trabalhava em um laboratório não sei de que. Minha avó dizia: “Helô é uma vagabunda. Pegou um filho desse ordinário”. Eles eram meio chatos. As famílias, não me situo bem com elas. Eu e Rita Lee sempre fomos ovelhas negras. Eu sempre fui olhado com desconfiança.

OP – Quando foi que você despertou pro negócio do hippie, quando você se sentiu hippie?

Serguei – Na América. Eu adoro os Estados Unidos. Vivi lá 20 anos da minha vida. Nossa! O país é uma coisa, é um escândalo, é a maior nação. E eu sempre fui da gandaia, da noite. Lá já era um movimento. Eu vivi no bairro boêmio da época, o Greenwich Village, e conheci músicos de jazz.

OP – Qual a última vez que você foi aos Estados Unidos?

Serguei – Tem mais de 20 anos. Não tenho dinheiro. Conheci homens e mulheres da pesada.

OP – É onde eu já ia chegar. Nessas viagens você conheceu a nata do rock’n’roll.

Serguei – E da sacanagem também.

OP – Vamos começar com a do rock, depois a sacanagem.

Serguei – É que não tem nada melhor na vida que o sexo. Sou escravo do sexo. Cara é uma coisa incrível, eu sou muito cínico.

OP – Quem você conheceu de ídolo?

Serguei – As bonecas de Nova York (a banda New York Dolls). Eram homens de um metro e oitenta, todos de calcinha. Eram muito malucos... (pausa) Eu esqueci o que tava falando. Escuto muito Amália Rodrigues, curto muito e, só de sacanagem, conheci a Amália em Copacabana. Vi aquela mulher alta, com maxilar enorme, os cabelos faziam assim, alta, bonita, conversando com outra na porta de um prédio. Eu perdi o controle e falei: “você é a Amália Rodrigues?”. Ela olhou e respondeu: “que disseste, pá?”. Fiquei emocionado.

OP – E a Janis Joplin?

Serguei – Foi muito por acaso. Por exemplo, eu conheci a Janis, que todo mundo conhece. Ai uma vez eu tô numa festa de colégio, tocando com uma banda que eu tinha lá. Eu estava lá e vinha descendo um porto-riquenho com cabelo grande e uma cigana, saia comprida, com turbante e óculos John Lennon, que era ela. E eu gritei, “Laudir”. O Laudir Oliveira era percursionista era o cara que tava com ela. Eu comecei a gritar chamando o Laudir e ela ficou de lado. Hora sorria, hora ficava séria. Ele disse, “Serguei, essa é Janis Joplin”. Eu disse: “Quem? Tem certeza que não é a Jaqueline Kennedy?”. Ele respondeu, “Serguei, olha bem que você vai ver que é a Janis”.

OP – Eles namoravam?

Serguei – Não, eram amigos. Ele tocava com a banda Chicago. Mora em Ramos (Rio de Janeiro), atualmente. Ele era muito amigo do John Lennon também. Dessa história, eu fiquei muito dessituado e dei um beijo nela aqui (aponta para o pescoço).

OP – Isso foi antes ou depois de Woodstock ?

Serguei – Depois. Teve uma vez, no Rio, que eu encontrei um amigo que me ligou dizendo: “eu tô muito nervoso. Imagine você que eu passei de carro e vi uma mulher encostada no Jóquei Clube, bebendo cerveja numa latinha. Eu olhei e quando vi que era a Janis Joplin. Fiquei louco não sabia pra onde ir, me perdi”. Ele deu a volta, parou e quando ela viu perguntou se eu queria um pouco. Ele gritava no telefone.

OP – E como foi sua relação com ela?

Serguei – Eu tinha loucura pra conhecer Janis Joplin. Quando ela tava viajando, ficava em grandes hotéis. Quando não, ficava em motéis, que lá nos Estados Unidos é muito usado pra poder fugir de paparazzi. Eu fiquei com ela lá uma vez e tocou uma buzina. Bam, bam, bam. (Serguei) “Olha, tem um negão bonito com uma camisa azul de manga comprida e cabelão black power. Ele tá olhando pra cá, parece o Jimi Hendrix”. Ela disse assim, “você não sai daqui”. Ela foi falar com ele, virou e deu um beijo na boca dele. Eu fiquei olhando e louco, brabo. Depois que ela voltou fiquei sem falar com ela um pouco.

OP – Tô vendo que vocês eram bem próximos.

Serguei – Uma vez eu fiquei sentado numa mesa ouvindo ela cantar no banheiro. Ela cantava tão bem como se estivesse dopada. Quando ela saiu do banheiro pelada com a toalha no ombro olhou pra mim e disse “so?”. E eu disse que estava ouvindo ela cantar tão bem como se estivesse drogada nos concertos de rock. Eu disse: “você não precisa dessas porcarias. Você pode, de repente, deixar a gente”. Ela disse: “Serguei, ninguém me força um jogo”. E eu fiquei uns dias enjoado. Ela me perguntou o que eu tinha e eu disse que queria conhecer o Jimi Hendrix.

OP – E conheceu?

Serguei – Olha como é a vida. Um dia ela disse que nós tínhamos uma festa na casa do Jim Morrison (vocalista do The Doors). Eu disse “que maravilha!”. Ela era mandona e disse “você não vai mostrar a sua maldita língua, porque ele tem sempre ácido”. Era um vermelho, cor de abóbora no bolso. Ele enfiava a mão no bolso e quando você ri enfiava um ácido na tua garganta. Tava lá Jim, Janis, Pamela (mulher de Jim), Kris Kristofferson e um amigo dele milionário que tinha 19 anos.

OP – Você falou um bocado de coisa sobre seu contato com a Janis, mas como foi conhecer Jim Morrison?

Serguei – Morrison tava sentado ao meu lado no sofá uma vez e eu tava olhando. Eu dei uma geral. Pensei “ele é muito bonito, deve ser alto”. Quando Jim levantou, eu falei “meu Deus, como ele é alto”. Ele perguntou, “qual o problema?”. Eu respondi que não tinha problema é que “você é tão big”. Mas big pra eles é “gordo”. E eu expliquei que tinha diferença entre big, “grande” e “gordo”, no Brasil. Ele riu e deu um beijo no meu pescoço. Por isso que, até hoje, eu não lavo o pescoço desse lado. Eu estico a língua e fico lambendo o pescoço.

OP – As pessoas falam muito sobre a história do pansexual.

Serguei – Não, aquilo é brincadeira. Eu falei que eu tava com muito tesão num dia de verão e fui caminhando pelado pela estrada dos cajueiros lá em Saquarema. Me deu um tesão e eu quis bater umazinha e tal. Eu me escondi atrás de uma árvore. Quando acabou a parada, eu me agarrei com a árvore porque não tinha com quem me agarrar. Mas, daí eu comer a árvore, não. Como é que eu ia comer um cajueiro? Foi o Jô (Soares) que disse que eu comi a árvore. E eu disse: “é, Jô, comi” (decepcionado) e assinei uma sentença.

OP – Então é pura brincadeira?

Serguei – É, é pura brincadeira.

OP – Mas você não se incomoda com essa brincadeira?

Serguei – Não, só se fosse um cactos.

OP – Falando em Jô, você sempre aparece na televisão e agora vem fazendo uma participação no programa do Tom Cavalcante.

Serguei – Eu admiro muito o Tom Cavalcante. Ele é um espetáculo, não só como comediante. Ele é uma pessoa ímpar! Boníssimo, ajuda todo mundo. Uma vez ele levou o Fagner pra cantar no Show do Tom e depois todo mundo quis tirar fotos comigo. Eu disse pro Fagner que ia roubar todo mundo pro rock, ele ficou rindo. O Tom outro dia me chamou e falou: “eu quero que você saiba que estou muito feliz por você estar aqui, que a sua presença me comove”. Ele teve uma infância meio dura, mas mudou por quê? Porque aqui a gente planta e colhe o que plantou.

OP – Você é uma pessoa religiosa?

Serguei – Sou espiritualista. Porque somos todos espíritos. Eu cuido muito de mim, espírito.

OP – Você disse que era pura brincadeira a questão do pansexual, mas o que é verdade a respeito da sua sexualidade?

Serguei – Eu gosto muito de sexo. Eu não escolho. Sou parte do bloco Vai Quem Quer, um bloco que tem no carnaval carioca.

OP – E você é um fiel praticante.

Serguei – Eu não perdi o tesão sexual que eu tinha. Pelo contrario, eu fico lá. Se bem que a minha posição no sexo fica meio difícil. Eu gosto de curtir com o mesmo lado e, às vezes, com o outro lado, dependendo da garota, do momento. Mas eu prefiro o mesmo lado, que eu me amarro.

OP – Você prefere homens?

Serguei – É. Na vida o que importa é ser feliz. Eu pra fazer minha felicidade não vou ter que fazer a felicidade do time do Quixeramobim. Eu não ligo pra porra nenhuma, entendeu? Eu quero é curtir a vida.

OP – Como você mantém essa sua energia sexual?

Serguei – Eu não sei como eu mantenho. Já roubei praticamente metade das mulheres deles (olhando para a banda), já roubei os primos deles, os amigos também. Sabe aquela música da Ademilde Fonseca? O que vier eu traço? Pois é. Mas depende. As árvores não, mas o resto vai de boa.

OP – Mas você já tomou algum comprimido ou é só na saúde mesmo?

Serguei – Não. Quando você sai com dor de cabeça você vai na farmácia e compra Melhoral. Quando você ta brocha, que seu pau não levanta – desculpa, mas pau todo mundo tem – é diferente. Se você tiver saúde, não precisa de remédio, dos azuis. Eu nunca usei essas coisas. Mas, se precisar, é até bom mesmo, porque me convidaram pra fazer uma entrevista com Páginas Azuis.

OP – O que você faz pra cuidar da saúde?

Serguei – Eu me movimento o dia todo, cuido dos meus dez cachorros, subo e desço escada, nado na piscina. Quando eu fiz 60 anos, fiquei apavorado. Mas meu médico disse: “você tá bem, se sente bem, você tem entusiasmo. Então, tá tudo bem”. Quando tinha 57 anos, fiz alguns exames nos EUA e os médicos disseram que minhas células se multiplicam muito rápido, elas renovam as outras. Esse ano faço 78 anos. Tô ficando meio cavernoso, meio Keith Richards, bem Stones. Só não transei com o Mick Jagger.

OP – Já fez plástica?

Serguei – Não (Começa a esticar a pele do pescoço). Não dá. Eu tenho artrose generalizada, mas não dou confiança.

OP – E como foi sua relação com as drogas?

Serguei – (Serguei faz um expressão de desprezo) Eu sou muito vaidoso, pinto muito meu olho e vejo que dá resultado. (Com drogas) a pálpebra fica inchada. Com cocaína o cara fica estranho (faz careta). Eu digo: “Deus me livre, são mortos vivos”. Não quero essas merdas, nunca.

OP – Mas já provou?

Serguei – Só provei uma vez e fiquei leso. Isso não serve pra mim. Pra me acelerar basto eu também. Não quero sustentar a máfia desdentada do Brasil.

OP – Você é um roqueiro com poucas coisas gravadas. Queria ter gravado mais?

Serguei – Eu tenho oito discos. Não queria porque sou do tempo em que as gravadoras botavam o ferro em cima. Diziam o que tinha que gravar. Eu acho que me antecipei à vanguarda. Então não tô nem aí. Minha música, há alguns meses, tava em quarto lugar em Nova York. Estavam querendo mostrar toda arte psicodélica. E esse álbum é muito psicodélico.

OP – Em sua opinião, quem foi o maior roqueiro da história?

Serguei – Eu (risos).

OP – Então em segundo lugar?

Serguei – Eu gosto muito das letras de Raul Seixas, de Renato Russo, de Cazuza, meu baby. O Caju era tudo. Ele falava como você e as letras brotavam dos lábios dele. Nós sempre fomos da pá virada, plantávamos o terror nas noites cariocas. Eu adoro o Mick Jagger e acho que a melhor banda de rock do mundo é Rolling Stones. Agora Beatles é a maior obra literária-musical de todos os tempos.

OP – Como é sua vida financeira hoje?

Serguei – Eu vivo com três salários. Meu pai me obrigava a pagar. Me dão R$ 1 mil por mês pra ajudar a manter o Templo do Rock. A casa é grande, são dois andares e tudo foi comprado na América do Sul, com muito sacrifício. Porque só sou rico de sacanagem e de rock’n’roll. Mas eu vivo bem. Faço muitos shows, graças a Deus. São três ou quatro por mês. Eu não aguento mais também.

OP – Você mora só. Pra quem viveu e vive tantas historias não é ruim morar só?

Serguei – Não, é melhor que morar com espírito de porco. Minha casa é muito bonita, é um paraíso psicodélico. Os programas que eu fiz com o Multishow foram filmados lá.

FONTE: http://www.opovo.com.br/app/opovo/paginasazuis/2011/07/11/noticiapaginasazuisjornal,2265857/sou-escravo-do-sexo.shtml

Um comentário:

  1. Brava gente brasileira! Palmas para voce Sergei! Se os bandos hippies das bandas hippies fossem como voce, estariam todos aqui, curtindo a vida na terra
    Abraços

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